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Pirex sem tampa

Eu estava preparando meus legumes orgânicos, tooooda contente. Preparei tudo, estava lindo e colorido para irem ao forno.

Enquanto isso fui cuidar de outros temas até o cheirinho me convidar para testar se estavam no ponto.

Como estavam agarrando no fundo do pirex, resolvi colocar um pouquinho de água e, POW!

Foi uma explosão de cacos para todos os lados.

Após me conformar em jogar os vegetais no lixo ( juro, pensei em dar uma lavadinha), fui cuidar de limpar o forno e o chão que ganharam uma capa de azeite.

Não importa o quão de boa qualidade seja o azeite que você usa. Nessa hora equivale à um pote de margarina hidrogenada da pior espécie.


Algumas tradições dizem que quebrar louça é sorte, outras dizem que é azar; então não há consenso.


Aí comecei a pensar no ato em si: vidro quente + agua fria = choque térmico.

Não é necessário conhecer as leis da física para saber que não tinha chance de dar certo.

A questão que bailou na minha frente para refletir era, qual razão impulsiona para que façamos coisas que sabemos que não dará certo?


Quem nunca teve o sentimento de "eu sabia", após um desfecho complicado?

Se observar, tem um impulso, uma voz que diz "faz isso não!", mas é comum não dar ouvidos. No caso dos legumes eu, claramente, aproximei e afastei o copo com água duas micro-vezes antes de seguir. Porque não me ouvi?

A resposta me chegou relativamente rápido. Foi porque eu não estava PRESENTE.

Isso fez sentido. É o mesmo movimento que acontece quando esperamos algo, sabendo que não vai acontecer.


Esperar um ônibus depois do horário, ( vai que o motorista se atrasou na saída?)

Ver um filme ruim até o final, ( sei lá, deve melhorar do meio para o fim)

Manter uma relação, ( as coisas sempre podem mudar)

É verdade, as coisas sempre podem mudar para melhor, desde que o fiel da balança interno informe que sim.

Se eu estivesse presente, perceberia minha hesitação e este sentimento óbvio, informava para não seguir.


Como simbolismo, fiquei com uma tampa sem pirex. Não é mesmo assim? As coisas se quebram e guardamos as tampas na esperança de um dia encontrar um outro pirex, onde a tampa se adapte.

Pode até ser que outro pirex apareça, mas não será o mesmo. O apego a tampa é um caso sério.

Guardamos lenços, flores secas e muitas conversas sem interlocutor, na convicção de que terão ainda alguma serventia. A questão não é sobre guardar, é sobre o que realmente queremos quando guardamos.

Roupas que nunca mais caberão, livros que não serão lidos, louças que nunca servirão aquele jantar, tampas dos potes dos desejos quebrados e não realizados.

E volta-se ao ciclo "eu sei que não deveria, mas...".


Parece que muito desta hesitação, esta dúvida das nossas vozes e insights, está condicionada aos medos da escassez e da dor.

Temos pavor de ficar sem algo. Preferimos a tampa sem pote. O bilhete sem o remetente. A manutenção de uma atividade sem nenhuma satisfação. Inconscientemente preferimos a dor.


Acontece que, verdadeiramente, a vida não é nada escassa. E muitas vezes precisaremos abrir nossos armários e nos desfazer de tanta coisa que não serve para nada, como ensina Marie Kondo.

Não acredito em segredos, mas se tem algum, é sobre se conectar e perceber os sim e não, que estão fartamente disponíveis

dentro da gente.


Eu poderia estar choramingando meus legumes, mas viver esta experiência me trouxe o movimento de dar destino à outras "tampas sem pirex" e "potes sem uso".


Na imagem, a tampa do pirex seguindo o destino dela para ser qualquer outra coisa.

PS ( aposto que embaixo da sua pia você vai encontrar um monte) Divirta-se.

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CELIA BARBOZA

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